05/11/2009
O que Antonio Candido, Florestan Fernandes e Jorge Amado há muito enxergaram com profunda admiração, ainda falta muito para que uma maioria abra os olhos e aprenda um pouco mais sobre a vida de Carlos Marighella, que sempre lutou por uma sociedade justa, igualitária e humana. Na esteira de atividades que ocorrem por todo o país em um esforço coletivo de resgate da sua história, houve nesta quinta-feira (5/11), no auditório da Alerj, entre 18h30 e 21h, uma homenagem a esse poeta guerrilheiro, organizada pelo mandato Marcelo Freixo (PSOL), MST e movimento Consulta Popular.
Durante a cerimônia, houve o lançamento do livro Carlos, a face oculta de Marighella, pela editora Expressão Popular, de Edson Teixeira da Silva Júnior, professor do Centro Universitário de Volta Redonda e doutor em História pela UFF. Em seguida, houve um debate com participação do deputado, do autor do livro e também de Carlos Eugênio Paz "Clemente", que conviveu com Marighella que o comandou na organização Aliança Libertadora Nacional (ALN). "Estamos em uma jornada nacional em homenagem a Marighella. O objetivo é passar para quem não viveu aquela época o exemplo desse lutador", explicou Maria Júlia, da Consulta Popular.
Edson, mais conhecido como Edinho, apresentou o panorama histórico em que a imagem de Marighella se reduziu, para a opinião pública, a de um mero assaltante de bancos ou terrorista. O pesquisador reunidos dados desde a infância do fundador da ALN com o objetivo de apresentar um perfil quase desconhecido do grande público, de um homem terno, solidário, que pregava o amor e a tolerância, na vida pessoal e também na política. "Ele enxergava já naquela época a necessidade do exercício da tolerância entre aqueles que lutavam no campo da esquerda, diante do inimigo comum, um exemplo para nós da esquerda brasileira que nos digladiamos internamente", destacou Edson.
O militante da ALN, emocionou o público no auditório ao falar sobre os tempos em que caminhava lado a lado com o poeta guerrilheiro. Clemente tinha apenas 15 anos quando ingressou na ALN e se tornou companheiro de lutas de Marighela. "Como podemos dar a vida a uma causa sem emoção? E Marighela é um exemplo de homem que viveu conforme aquilo que pregava, um homem inteligente, que se formou na Politécnica da Bahia. Ele foi deputado federal aqui no Palácio Guanabara, quando o Rio era a capital do país. Só pegou em armas para enfrentar a tirania", declarou Clemente, autor do livro Viagem à luta armada, sobre suas experiências sob o comando de Marighella.
Marcelo Freixo chamou a atenção para o fato de a imagem da coragem de Marighella ter prevalecido com o passar do tempo em contraponto a sua personalidade de caráter reflexivo: "Embora faça essa observação, é importante que se destaque a coragem, porque esta se contrapõe ao medo. E o medo é produzido de modo estratégico. Há uma produção do medo que nos leva ao isolamento, ao individualismo, à identificação do inimigo. E hoje esse medo não está direcionado à juventude de esquerda, mas ao jovem pobre, negro, da favela, a quem sobrou nessa nossa sociedade de mercado. Há um debate para se saber quem é gente ou não, quem deve ser eliminado no seu significado de existência, quem deve morrer mesmo que ande por aí. A luta da esquerda precisa ser pedagógica para que a gente consiga dialogar com quem tem a face marcada pelo terror".
Freixo destacou ainda que não há democracia para todos no país. "Hoje há tortura, por exemplo. Basta ir às carceragens, às delegacias. Não vivemos em um estado democrático de direito. Não podemos dizer isso enquanto um terço da população vive em estado de exceção, em um contexto onde o estado se associa à barbárie. É por isso que essa luta, da qual fez parte Marighella, precisa continuar, numa luta permanente. E o mandato, em articulação com o movimento social, tem de fazer do parlamento uma trincheira da luta política mais ampliada".
Eleito com 5 mil votos pela Bahia, Marighela foi deputado federal de 1946 a 1947, liderou a bancada de 14 parlamentares comunistas, até que teve o seu mandato cassado. Segundo Edson, ele proferiu 196 discursos em dois anos, todos de denúncias da opressão e contra o imperialismo. Ele, que também editou a revista Problemas, só entrou para a luta armada quando não enxergou alternativa e em meio à qual foi assassinado em 1969. "O ato de hoje cumpre um importante papel de trazer Mariguella de volta ao espaço do Legislativo", concluiu Antonio Neto, coordenador nacional do MST.
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